Uma receita de tagliatelli e um amigo...



Eu nunca gostei de massa, nem mesmo quando era pequena. Minha mãe fazia macarrão mas eu só comia se fosse afogado em muito caldo de feijão. Nunca gostei muito mesmo. Quando viajava com amigos, em acampamentos ou na casa de praia, quando todos se jogavam num prato de miojo ou numa macarronada eu preferia um iogurte ou um pão com manteiga. Massa pronta nunca me interessou, nunca achei interessante. Mas com o passar do tempo duas coisas aconteceram. Primeiro eu conheci um moço italiano, um amigo querido, amigo mesmo. Um artista que trabalhou numa das reformas gráficas da Folha de S.Paulo e que nos anos 90 conquistou o coração de todos nós da redação.



Nosso amigo querido adorava receber os amigos em seu imenso e lindo apartamento na Praça da República, em pleno Centro de São Paulo. No dia do meu primeiro jantar em seu apartamento, ainda na redação, meu amigo me perguntou muito naturalmente: "você gosta de pasta?" E eu respondi: "Não, mas eu como mesmo assim". E meu amigo falou: "você não gosta dessa massa comprada pronta, mas da minha pasta você vai gostar". E eu gostei. Ele fez para um pequeno grupo de amigos, naquela noite, um tagliatelle fresco e serviu com um molho de anchovas e alho. Aquela foi a melhor massa que eu comi na minha vida e ela foi marcante. Por causa daquela noite e daquela massa eu passei a apreciar massa e passei a fazer massa em casa e nunca mais deixei de fazer massa com molho de anxovas e alho.



Meu amigo italiano comandou a reforma gráfica da Folha de S.Paulo, fez montes de outras coisas para imprensa brasileira, casou com uma brasileira linda e teve uma filha linda, linda, linda. Mas, de um dia para o outro, ele foi derrotado por um câncer terrível. Em pouco tempo ele foi levado de nossas vidas para sempre. Meu querido amigo italiano, apaixonado pelo Brasil, por São Paulo, pela vida, pelas pessoas, por comida boa, não teve chance de ver sua linda filha crescer. Ele nos deixou para sempre em 2006, mas sua obra está disponível para todos.





Por influencia dele eu percebi que massa caseira é uma criatura totalmente diferente de massa pronta e desde então eu passei a gostar de fazer e comer massa caseira. Continuo a desgostar de massa pronta. As crianças aqui em casa amam, mas eu não gosto. Até como eventualmente, mas não me agrada. Mas a minha massa, a massa que eu faço a mão, por influencia do meu amigo italiano, eu adoro e cada vez que faço dedico meu esforço e o resultado ao meu amigo. Eu sempre invento maneiras diferentes do servir e de cortar a massa. Mas o tagliatelle é o mais clássico. As crianças, como era de se esperar, gostam de massa com molho de carne e foi assim que eu servi ontem. Fiz uma espécie de ragú com carne e toucinho defumado. Deixei o molho cozinhar em fogo baixo por mais de uma hora e ficou uma maravilha.



Tagliatelle com ragú de carne e toucinho

Para o tagliatelle:

400 gramas de farinha de trigo
4 ovos
2 colheres de sopa de água (opcional, depende da umidade da tua cozinha)

Como

Num pote misture ovos e farinha até forma uma massa macia que degruta totalemnte das mãos e que é muito fácil de abrir. Sove a massa por uns 10 ou 15 minutos e deixe-a descansar por uns 20 minutos. Corte a massa sovada em três partes menores e abra um de cada vez. Abra a massa bem fina, o mais fina que conseguir. Quanto mais fina melhor. Enrole e corte fatias da massa mesmo que de tamanhos irregulares. (Veja as fotos abaixo). Se preferir deixe a massa secar um pouquinho num escosto de cadeira.

Na hora de cozinhar ferva água com sal numa panela grande sobre fogo alto. Quando a água ferver reduza o fogo e adicione a pasta. Quando começar a ferver deixe a massa cozinhar por 2 minutos em água fervendo. Escorra, adicione o molho e sirva imediatamente.





















Ragú com carne e toucinho defumado

(para 4 pessoas)

500 gramas de carne moída com pouca gordura
200 gramas de toucinho picadinho com a faca
1 cebola média picadinha
6 tomates pelados picados
1 cenoura grande ralada
4 dentes de alho ralados
1 copo de vinho branco
sal e pimenta do reino
páprica doce em pó
duas colheres de sopa de azeite de oliva
salsinha picada a gosto
um folha de louro (opcional)
água ou caldo de legumes suficiente para cobrir todos os ingredientes na panela

Como:

Numa panela grande aqueça o azeite. Adicione o toucinho picado e deixe dourar. Adicione a carne e deixe dourar e secar até grudar na panela. Adicione a cebola e o alho ralado e quando começarem a dourar adicione o vinho e deixe dar um boa evaporada. Adicione a cenoura, os tomates, a salsa picada, a água (ou caldo) o sal, a pimenta, a páprica, o louro e deixe ferver. Quando ferver abaixe o fogo bem baixo e deixe cozinhar por cerca 50 minutos ou uma hora até formar um caldo grosso.

Comentários

Nina disse…
Adoro as histórias por trás das suas receitas, muito mesmo...

A desse texto foi comovente.

Saudades, saudades...
® disse…
Ah! Amore...
Hoje foi um dia de muita emoção em sua cozinha...=)
Que lindas e doces palavras, deixou nosso coração mais aquecido...
Eu já amava massas, casei c um paulistano, aprendi amar SP...e aprendi que a Itália é praticamente aqui...Mas agora vou comer com um sabor de saudade..saudade boa, tá?!
Um bejim no seu coração,
da Vinni
Unknown disse…
Esta massa é fantástica, nunca me aventurei a fazer massa fresca pois não tenho a máquina para passar a massa, mas as suas fotos mostram tanta simplicidade em fazer massa, que eu acho que vou arregaçar as mangas e experimentar.

Beijinhos e bom fds
Paula Mello disse…
Claudia, que delícia! Aqui em casa também fazemos, na nossa maquininha de rolos de inox, uma fofura que aguenta macarrão às vezes pra 5, às vezes pra 10...
Sobre o seu amigo, tenho certeza de que ele, lá do céu, fica feliz toda vez que vc faz esta maravilha em nome dele...
Um fim de semana iluminado!
QUE SAUDADE BATEU DE COMER UMA MASSA FRESQUINHA, ACHO QUE JA DECIDE AQUI MEU ALMOÇO DE DOMINGO. BEIJINHOS
Carolina Andrade disse…
Clau, que linda história. Sua paixão pela massa veio de uma maneira toda especial, aposto que quando come sente uma felicidade imensa! Minha amiga volta hoje da itália e ela comprou farinha 0000 pra mim. Vou fazer essa receita. Um grande beijo
Claudia Lima disse…
Puxa, que triste a história do seu amigo. Era muito bonito tb.
Eu adoro massas, mesmo as prontas.
Minha avó fazia massa caseira, quando eu era criança e eu adorava ajudar. Ela tem a máquina.
Este prato ficou super suculento!
Bjs :)
Cininha disse…
Bonita dedicatória ao seu amigo.
Massa/pasta eu adoro de todos os modelos e feitios, mesmo da de compra, imagina se eu provassse dessa fresca, nunca comi dessa, por aqui não há esse costume de fazer massa fresca, mas penso que nos hipermercados há a vender.
Tá quase com um pé lá no brasil né menina Claudia :-)
Boa viagem para voce e que aproveite bastante :-)
bjs
Nada se compara ao sabor da massa caseira e ao prazer de fazê-la! Hoje me aventurei no capeletti. A próxima será essa!!! Ficou incrível!!!
Bjs
Gina disse…
Você encontra muitas maneiras boas de espantar o frio. Uma delas é dedicando-se a pratos que exigem muitas horas de fogão ou massas abertas no rolo...
Agregar a saudade dá um saborzinho especial ao prato.
Boa viagem!
Paula Pacheco disse…
Por de tras de hisotrias comoventes existem pratos lindos, e fiquei lendo do inico ao finzinho, adoravel lembranças de seu amigo italiano, e que bom que vc passou a fazer massas caseiras, muiiiiito melhor com certeza,
bjs
Paula
Anônimo disse…
Sempre passo por aqui mas nunca comentei. Não sei o que é melhor, as receitas, as fotos ou as postagens, oh! Dúvida cruel! Tudo é simplesmente divino. Receitas salgadas por aqui são raridade ou estou errada? Será que é o entusiasmo da viagem para o Brasil? Se está com saudade do calor não poderia ter escolhido ano melhor, hj mesmo falei com minha sogra(é que estou morando até abril nos EUA) e ela disse que a sensação térmica nos últimos dias foi de 51 graus, é mole ou quer mais?
Bjs calorosos
Valéria
Dani disse…
Que bonito ter uma recordação assim, uma saudade aliada a um prazer que se repete...
Sabe que eu hoje estava morrendo de vontade de comer tagliatelli e não tenho em casa. Não tenho tempo de fazer a massa hoje, estou atarefada, mas com certeza vou tentar. Pensei que sem a maquininha não dava, mas você fez parecer tão fácil!
Também coloco bacon defumado no meu ragu, não tocinho ou pancetta, mas um defumado e curado daqui que é uma delícia.
Mas quero fazer o meu com porcini, si!
Estou adorando os salgados!
Ah, você deve estar de partida, aproveite muito a sua estadia no Brasil, você merece!
Um beijo,
Susana Gomes disse…
Ver um amigo partir é sempre tão triste... bela herança ele te deixou! :)

Eu adoro massa fresca e caseirinha de preferência.
E para fazer ravioli e inventar recheios, então aí perco-me! :)

Beijinhos e bom Carnaval.
Como apenas ovos e farinha podem fazer algo tão bom como a massa desta receita. Acabei de a fazer e de a comer não com o ragu mas com bacon e pimenta preta salteada em azeite.

Obrigado por partilhar a receita e essa historia tão especial.
moranguita disse…
eu ca sou doida por massa mas ainda nao me aventurei a fazer massa em casa mas deve ser uma delicia:-)
beijinhos
Fiquei emocionada com a história e deliciada com a massa fresca que ando para experimentar desde Dezembro, pois ofereceram-me uma máquina para a estender.
Espero que tenhas feito uma boa viagem, te divirtas e que mates as saudades ;)
Beijinho
Moira

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